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sábado, 1 de maio de 2010

Gestão escolar: por uma escola consciente do seu papel social

No século da ciência, o planeta se contorce para sustentar a avalanche de informações e transformações que alteraram a rotina da humanidade. Seus ventos não trouxeram, excepcionalmente, comodidade; todavia, encurtaram distâncias, liquefizeram culturas, desvendaram os segredos dos povos, facilitaram a vida... Abriram vácuos, incertezas. Idéias e comportamentos entram em colisão. Tamanho alvoroço se alarga para todos os setores, principalmente para a escola, que exige otimismo e iniciativa dos gestores para atingir a meta da formação de uma sociedade coerente em tempo de astigmatismo.
O desafio maior é edificar a escola ideal que impulsione sistema educacional, governo, educadores e especialistas a discutirem alternativas, romperem obstáculos, contradizerem conjeturas e confrontarem com a resistência de uma sociedade que sonha com melhorias, mas não se organiza para obter uma educação formadora.
Fortalecer as bases do ensino é uma necessidade tão emergente que incomoda muitos, pois a gestão descentraliza poderes, ramificando as discussões de medidas e mudanças — mudanças imperiosas estabelecidas pela Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB), promulgada em 1996 através da Lei no 9.394/96. Dissolver os ranços, desagregar o sistema de méritos e influências políticas para implantar um modelo democrático-flexivo está sendo um grande obstáculo.

Na concepção da mestra em Educação Gilda Luck,

a gestão escolar constitui uma dimensão e um enfoque de atuação que objetiva promover a organização, a mobilização e a articulação de todas as condições materiais e humanas necessárias para garantir o avanço dos processos sócio - educacionais dos estabelecimentos de ensino, orientados para a promoção efetiva da aprendizagem pelos alunos, de modo a torná-los capazes de enfrentar adequadamente os desafios da sociedade globalizada e da economia centrada no conhecimento.

Para realizar esse sonho, é imprescindível despertar a comunidade escolar para sanar um problema que exige a participação de todos, pois superar o maior desafio do terceiro milênio, que é o equilíbrio para conquistar a sustentabilidade, exige da educação modificações emergentes, porque, como veículo intercessor, obrigatoriamente, deverá se reestruturar para confrontar com tal realidade. Todos os ingredientes têm que ser adicionados: investimento na infraestrutura, aquisição de recursos tecnológicos, planejamento e inserção da comunidade escolar.

A essa altura, a ação pedagógica é insuficiente perante o colapso. São forçosas transformações que ampliam horizontes, descartando métodos e teorias frívolas por conteúdos que enfoquem saberes que destaquem a escola como instrumento de integração. O processo educativo atual está desprovido de teores que resgatem a essência da família; os valores morais, étnicos, culturais; os princípios; e, sobretudo, o respeito, pois a desestrutura familiar é espantosa, e a escola não consegue desempenhar esse papel se o aluno não sentir um estímulo significativo no processo de aprendizagem.

Para o professor Libânio, a gestão constitui elementos imperiosos como a autonomia das escolas e da comunidade educativa, o envolvimento da comunidade escolar no processo escolar, a formação continuada para o desenvolvimento pessoal e profissional dos integrantes da comunidade escolar, a avaliação compartilhada e as relações assentadas na busca de objetivos comuns.
Infelizmente, mesmo envolta no contexto social, a escola confronta com obstáculos para se socializar. Ante a desordem, não educa, apenas ensina através do acúmulo de conteúdos, por ser administrada sob influências políticas, partidarismo interno, deixando perguntas pairarem no ar: Por que o descaso dos governantes com a gestão democrática? A democracia romperia a ligação do sistema educativo com a política?
Excepcionalmente, são evidentes as atitudes de gestores que se tornam o centro das decisões, hierarquicamente ditados pelo sistema que monitora metas, bloqueia objetivos, veta mudanças, salientando as manifestações de domínio e autoridade que tornam real o mito de que a nossa educação reflete pensamentos neoconservadores, que agregam alvos e desígnios aos interesses políticos e particulares.
Há décadas, o mestre Vitor Henrique Paro, especialista em Administração Escolar, já salientava os ingredientes de uma boa gestão, como o comprometimento dos segmentos da comunidade escolar.
A administração escolar inspirada na cooperação recíproca entre os homens deve ter como meta a constituição, na escola, de um novo trabalhador coletivo que, sem os constrangimentos da gerência capitalista e do parcelamento desumano do trabalho, seja uma decorrência do trabalho cooperativo de todos os envolvidos no processo escolar, guiados por uma “vontade coletiva”, em direção ao alcance dos objetivos verdadeiramente educacionais da escola.
Essa advertência quase profética se esvaece ante o descompromisso de muitos gestores que se sobrepõem aos princípios democráticos e, desviando-se do propósito “construção do conhecimento”, miram nas metas das relações políticas, em que gestores são indicados por grupos e um decreto proporciona aos nomeados autonomia para delinearem caminhos e postergarem direitos — principalmente para quem não é efetivo no emprego, que trabalha sob pressão, comprometendo bons resultados.
Ainda com o alto investimento por parte do governo e o superficial envolvimento da comunidade escolar nas prestações de conta de tais recursos, estamos distantes de uma gestão escolar hábil, pois o autoritarismo e as atitudes antidemocráticas e anti-sociais são claríssimos nos corredores, nos pátios e nas salas de aula.
Nessa jogatina, o educador se depara com dificuldades para construir a própria identidade profissional, pois ser reflexivo num ambiente de instabilidade é desmotivante. Mesmo os ativos e responsáveis se vêem impossibilitados de levar um trabalho avante, pois muitos baseiam as suas metas em referências acadêmicas e abrem mão dos saberes subjetivos para compreender que a construção da prática é a base de um processo contínuo na construção do conhecimento, com atividades que levem a soluções positivas.
Outro fator decisivo para uma gestão competente é a postura do gestor perante a nova visão da escola como agente transformador. Esse fator é simplesmente crucial, pois muitos confundem administração escolar com gestão escolar.
Como educadores, temos ciência de que, nesse quebra-cabeça, sempre faltará uma peça. Para entendermos, temos que nos conscientizar de que, para administrar uma escola, não basta dominar conceitos teóricos, ter referências ou espírito de liderança. É preciso idoneidade para traçar metas com a sociedade, os educadores e educandos. É nessa parceria que o gestor com visão do futuro projeta resultados, envolvendo a comunidade para esse fim por meio da capacidade administrativa e da moderação para gerenciar os conflitos.
Porém, enquanto imperar esse modelo de gestão direcionada pelo sistema político e a sociedade permanecer passiva, permitindo a exclusão e vetando discussões de melhorias, continuaremos a ter uma escola exclusivamente alfabetizadora. Como declara Rosse (2001): “[...] Todas as iniciativas de política educacional, apesar de sua aparente autonomia, têm um ponto em comum: o empenho em reduzir custos, encargos e investimentos públicos, buscando senão transferi-los e/ou dividi-los com a iniciativa privada e as organizações não governamentais”.
Ainda que os gestores escolares estejam cada vez mais aptos a exercerem a função, graças à facilidade de acesso às faculdades e aos recursos financeiros para estruturação e adequação das dependências físicas, das bibliotecas, dos computadores, da internet e dos programas do governo que investem em capacitação, é alarmante a multiplicação dos problemas.
Estes são tantos que deixam a comunidade escolar vulnerável, e não é preciso ir muito longe para vislumbrarmos tais horizontes: o educador que, até pouco tempo, era o contentor do conhecimento, cujas palavras eram absorvidas como alimento para fortal ecer os que tinham fome de aprender, perdeu autonomia e espaço e hoje é um simples mediador do conhecimento. O educando evoluiu a tal ponto que adquiriu mecanismos para ser o construtor do próprio conhecimento, e, com tantos autodidatas em sala de aula, o educador submergiu no oceano de instabilidade, porque as mudanças giram, exclusivamente, em prol do educando. Muitos educadores, com dois ou três turnos de trabalho, não têm tempo e ficam aquém dos seus alunos, que fazem uso da internet e de outras tecnologias.
Outro fator relevante é o rompimento do elo da escola com as bases do educando: gestores, educadores, famílias e sociedade, há tempo, não falam a mesma língua. Então... O que fazer?
Não precisamos de excelência para sanar problemas simples. Precisamos de gestores com espírito empreendedor, líderes com senso de justiça. Gestores que tracem estratégias seguras e planos reais, que tenham o mínimo de respeito com os educadores e dignidade com os educandos, que acreditem na força da Educação para transformar vidas, que modifiquem a realidade através de critérios que correspondam às suas expectativas de cidadão. Gestores desprendidos de influências político-partidárias e intrigas pessoais.

Nildo Lage

Um comentário:

  1. Professora, adorei o texto, estou com meu tcc em Gestão, muito bom.

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