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sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

FORMAR PARA A INCLUSÃO OU INCLUIR PARA FORMAR?

Não há dúvida de que podemos pensar na escola como instituição que pode contribuir para a transformação social. Mas, uma coisa é falar de suas potencialidades... Uma coisa é falar “em tese”, falar daquilo que a escola poderia ser. [...] outra coisa bem diferente é considerar que a escola que aí está já esteja cumprindo essa função. Infelizmente essa escola é sim reprodutora de certa ideologia dominante... É sim negadora dos valores dominados e mera chanceladora da injustiça social, na medida em que recoloca as pessoas nos lugares reservados pelas relações que se dão no âmbito da estrutura econômica. (Paro, 2001, p. 10). A idéia de escola inclusiva passou a ganhar força, a partir da década de noventa, com a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien, Tailândia, em 1990. Os primeiros reflexos no Brasil foram o PDE
(Plano Decenal de Educação – 1993/2003) e a nova LDBEN (9394/96).
Podemos identificar três grandes conotações na idéia de inclusão presentes nesses dois documentos. A primeira delas podemos chamar de “inclusão estrutural”. Tanto no PDE quanto na LDBEN, fica clara a intenção do governo de instituir a “gestão compartilhada”, na qual divide com a sociedade civil a responsabilidade de prover educação para todos. Nessa perspectiva, o modelo de gestão indicado pelo Estado necessita da “ideologia inclusiva”, da
qual nos fala Correia (2004), para dar conta da manutenção da escola. Com o discurso de incluir todos os segmentos da sociedade na tarefa de educar as futuras gerações, o governo repassa a responsabilidade dessa educação aos seus próprios beneficiários. Temos aqui a primeira conotação “inclusivista”: incluir, na escola, todos os segmentos da sociedade.
A segunda conotação da idéia de inclusão foi chamada de “inclusão social”. A necessidade de ampliar o acesso das crianças e jovens das classes menos favorecidas à escola consagrou-se sob a bandeira da inclusão, o que resultou no aumento vertiginoso das taxas de acesso à escola. É mais do que notório que esse aumento não foi seguido, na mesma proporção, pelas taxas
de permanência e, muito menos se traduziu em qualidade da aprendizagem.
O terceiro sentido da idéia de inclusão é a “inclusão das diferenças”, contido no discurso da “Educação para a diversidade”. É nesse contexto que se insere a inclusão do indivíduo portador de necessidades especiais, que a atual legislação define que ocorra, preferencialmente, nas classes e escolas regulares. Nesse tocante, como afirma Michels (2006, p. 421), O professor e
sua necessária formação aparecem como elementos decisivos no encaminhamento dessa versão de escola. Ou seja, o professor assume o papel de gestor da educação e a sua formação deve reafirmar tal função. Para isso, o governo propõe uma formação de professores aligeirada e utilitarista, tendo por base a prática docente.
Com relação à preparação do professor para lidar com a diversidade, em especial, com os alunos portadores de necessidades especiais, observam-se, a partir da literatura existente, duas linhas de discurso: a linha diretiva e a linha reflexiva. A linha diretiva, em síntese, toma a inclusão como um modelo predefinido; dá receitas sobre como ela deve ocorrer; discute a inclusão sem levar em conta as suas reais possibilidades. Alguns autores tratam a inclusão
de portadores de necessidades especiais como um problema restrito ao desenvolvimento de competências dos professores. Restringem a discussão às questões específicas relacionadas aos tipos de deficiência e pouco discutem a imprescindível tarefa de ensinar esses alunos. A linha diretiva de formação de professores para a inclusão orienta operacionalmente a ação docente, sem nenhuma preocupação com as reais condições dos indivíduos, das instituições e dos métodos. Encontramos diversos “Manuais” que ilustram bem essa linha.
Neles, pode-se ler, por exemplo, que com relação a alunos com distúrbios de comportamento, o professor deve aplicar técnicas de modificação de conduta; atribuir-lhes tarefas especiais e ignorar comportamentos inadequados, quando possível.
A linha reflexiva de formação analisa a inclusão como parte das questões sociais mais amplas e procura discuti-la articulada ao debate da educação geral. Nessa perspectiva, a materialidade das condições históricas e sociais para a inclusão é que possibilita a discussão sobre a mesma. Nesse tocante, a inclusão deve ser encarada à luz das suas reais possibilidades e não como “eixo temático” ou fim em si mesma. Além disso, a linha reflexiva propõe que professores alunos e sociedade sejam agentes do processo de discussão e não vítimas das decisões governamentais.
Nas duas linhas, porém, observa-se o mais completo abandono das questões subjetivas. O ato de incluir diferenças é, primeiramente, subjetivo, o que coloca a dimensão pessoal como essencial nesse processo de formação.
Uma política de formação de professores para a inclusão precisa, então, considerar as dimensões metodológicas, político-sociais e subjetivas concomitantemente, sob pena de “deformar” o processo.
Lidar efetivamente com diferenças em sala de aula é atitude que contraria a formação homogênea a que se submeteram os professores ao longo do tempo, além de se constituir orientação oposta à ideologia neoliberal de exclusão social.
Formar para a inclusão é tarefa que pressupõe a “inclusão” do professor em todas as suas dimensões. Somente um professor “incluído”, ou seja, levado em conta em suas instâncias social, política, metodológica e subjetiva tende a, verdadeiramente, promover inclusões. Reflitamos sobre isso.

Referências Bibliográficas:
PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Á tica, 2001.
CORREIA, José Alberto. A construção político-cognitiva da exclusão social no campo
educativo. Porto, Portugal: Universidade do Porto. 2004.
MICHELS, Maria Helena. Gestão, formação docente e inclusão: eixos da reforma educacional
brasileira que atribuem contornos à organização escolar. In.: Revista Brasileira de Educação, v.
11, nº 33. Set/Dez 2006. São Paulo.
Júlio César Furtado
Doutor em Ciências da Educação pela Universidade de Havana. Mestre em Educação pela UFRJ.
Pedagogo, Psicólogo e Professor. Vice-reitor da UNIABEU, RJ
Site do autor

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

Projeto Pedagógico: um estudo introdutório

Vivemos a época da "cultura de projeto" em nossa sociedade, onde as condutas de antecipação para prever e explorar o futuro fazem parte de nosso presente. Essa influência do futuro sobre nossas adaptações cotidianas só faz sentido se o domínio que tentamos desenvolver sobre os diferentes espaço cumpre a função de melhorar as condições de vida do ser humano. Portanto, foi a partir desse pensar inicial que surgiu este texto, com o objetivo de melhor compreender o significado e o processo do projeto pedagógico.
Partindo do óbvio, como sugere Gadotti (2001), a palavra projeto vem do verbo projetar, lançar-se para frente, dando sempre a idéia de movimento, de mudança. A sua origem etimológica, como explica Veiga (2001, p. 12), vem confirmar essa forma de entender o termo projeto que "vem do latim projectu, particípio passado do verbo projecere, que significa lançar para diante". Na definição de Alvaréz (1998) o projeto representa o laço entre presente e futuro, sendo ele a marca da passagem do presente para o futuro. Para Fagundes (1999), o projeto é uma atividade natural e intencional que o ser humano uti1iza para procurar solucionar problemas e construir conhecimentos. Alvaréz (op cit) afirma que, no mundo contemporâneo, o projeto é a mola do dinamismo, se tomando em instrumento indispensável de ação e transformação.
Boutinet (2002), em seu estudo sobre a antropologia do projeto, explica que o termo projeto teve seu reconhecimento no final XVII e a primeira tentativa de formalização de um projeto foi através da criação arquitetônica, com o sentido semelhante ao que nele se reconhece atualmente, apesar da marca do pensamento medieval "no qual o presente pretende ser a reatualização de um passado considerado como jamais decorrido" (p. 34).
Na tentativa de uma síntese, pode-se dizer que a palavra projeto faz referência a idéia de frentes um projetar, lançar para, a ação intencional e sistemática, onde estio presentes: a utopia concreta/confiança, a ruptura/continuidade e o instituinte/instituído. Segundo Gadotti (cit por Veiga, 2001, p. 18),

Todo projeto supõe ruptura com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma estabilidade em função de promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores.

E o projeto com a qualificação de pedagógico, qual é o seu significado? De repente, em meados da década de 90, a idéia de projeto pedagógico vem tomando corpo no discurso oficial e em quase todas as instituições de ensino, espalhadas nesse imenso Brasil. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/94), em seu artigo 12, inciso I, prevê que "os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terno a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica", deixando explícita a idéia de que a escola não pode prescindir da reflexão sobre sua intencionalidade educativa. Assim sendo, o projeto pedagógico passou a ser objeto prioritário de estudo e de muita discussão.
Para André (2001, p. 188) o projeto pedagógico não é somente uma carta de intenções, nem apenas uma exigência de ordem administrativa, pois deve "expressar a reflexão e o trabalho realizado em conjunto por todos os profissionais da escola, no sentido de atender às diretrizes do sistema nacional de Educação, bem como às necessidades locais e específicas da clientela da escola"; ele é "a concretização da identidade da escola e do oferecimento de garantias para um ensino de qualidade". Segundo Libâneo (2001, p. 125), o projeto pedagógico "deve ser compreendido como instrumento e processo de organização da escola", tendo em conta as características do instituído e do instituinte. Segundo Vasconcellos (1995), o projeto pedagógico
é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. E uma metodologia de trabalho que possibilita resignicar a ação de todos os agentes da instituição (p. 143).

Para Veiga (1998), o projeto pedagógico não é um conjunto de planos e projetos de professores, nem somente um documento que trata das diretrizes pedagógicas da instituição educativa, mas um produto específico que reflete a realidade da escola, situada em um contexto mais amplo que a influencia e que pode ser por ela influenciado". Portanto, trata-se de um instrumento que permite clarificar a ação educativa da instituição educacional em sua totalidade. O projeto pedagógico tem como propósito a explicitação dos fundamentos teóricos-metodológicos, dos objetivos, do tipo de organização e das formas de implementação e de avaliação institucional (p. 11-113).
O projeto pedagógico não é modismo e nem é documento para ficar engavetado em uma mesa na sala de direção da escola, ele transcende o simples agrupamento de planos de ensino e atividades diversificadas, pois é um instrumento do trabalho que indica rumo, direção e construído com a participação de todos os profissionais da instituição.
O projeto pedagógico tem duas dimensões, como explicam André (2001) e Veiga (1998): a política e a pedagógica. Ele "é político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo de sociedade" (André, p. 189) e é pedagógico porque possibilita a efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo". Essa última é a dimensão que trata de definir as ações educativas da escola, visando a efetivação de seus propósitos e sua intencionalidade (Veiga, p. 12). Assim sendo, a "dimensão política se cumpre na medida em que em que ela se realiza enquanto prática especificamente pedagógica" (Saviani, cit por Veiga, 2001, p. 13).
Para Veiga (2001, p. 11) a concepção de um projeto pedagógico deve apresentar características tais como:
a) ser processo participativo de decisões;
b) preocupar-se em instaurar uma forma de organização de trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições;
c) explicitar princípios baseados na autonomia da escola, na solidariedade entre os agentes educativos e no estímulo à participação de todos no projeto comum e coletivo;
d) conter opções explícitas na direção de superar problemas no decorrer do trabalho educativo voltado para uma realidade especifica;
e) explicitar o compromisso com a formação do cidadão.

A execução de um projeto pedagógico de qualidade deve, segundo a mesma autora:
a) nascer da própria realidade, tendo como suporte a explicitação das causas dos problemas e das situações nas quais tais problemas aparecem;
b) ser exeqüível e prever as condições necessárias ao desenvolvimento e à avaliação;
c) ser uma ação articulada de todos os envolvidos com a realidade da escola,
d) ser construído continuamente, pois com produto, é também processo.

Falar da construção do projeto pedagógico é falar de planejamento no contexto de um processo participativo, onde o passo inicial é a elaboração do marco referencial, sendo este a luz que deverá iluminar o fazer das demais etapas. Alguns autores que tratam do planejamento, como por exemplo Moacir Gadotti, falam simplesmente em referencial, mas outros, como Danilo Gandin, distinguem nele três marcos: situacional, doutrinal e operativo.

REFERÊNCIAS:
ANDRE,M. E. D. O projeto pedagógico como suporte para novas formas de avaliação. IN. Amélia Domingues de Castro e Anna Maria Pessoa de Carvalho (Orgs.). Ensinar a Ensinar. São Paulo, 2001.
BOUTINET, J. Antropologia do projeto. 5. ed. Porto Alegre: ARTMED, 2002.
LIBNLO, J. C. Organização e Gestão da escola: teoria e prática. Goiânia: Alternativa, 2001.
VASCONCELLOS, C. S. Planejamento: Plano de Ensino-Aprendizagem e Projeto Educativo. São Paulo: Libertat, 1995.
VEIGA, I. P. A. (Org.) Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 23. ed. Campinas: Papirus, 2001.
_______ . Escola: espaço do projeto político-pedagógico. 4. ed. Campinas: Papirus, 1998.

Maria Adelia Teixeira Baffi
Mestre em Educação - UFRJ
Doutoranda em Pedagogia Social - UNED
Professora Titular FE/UCP - Petrópolis, 2002

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Educar e Cuidar na Educação Infantil


Educar versus Cuidar
Elizabeth Amorim

Bebê
Coisinha deficiente, inconsciente, inerme,
inválida, trabalhosa, querida.
Mário Quintana – Na volta da esquina


Eu educo ou cuido? Cuido e educo?
Afinal, qual é o meu papel?
Provavelmente você já se questionou frente a essa dúvida, principalmente se atende crianças até a faixa etária dos 3 anos.
Por muito tempo, a ênfase no cuidado dominou o atendimento nos programas de creches, enquanto os programas pré-escolares tinham o enfoque educacional
como predominância; portanto, o “divórcio”entre educar e cuidar apresenta
longa tradição no atendimento infantil.
Mesmo hoje, ainda vemos nomenclaturas distintas para atendimento de 0 a 3
anos e de 4 a 5 anos. Por isso, nos perguntamos:
Por que creche e pré-escola, e não somente educação infantil? Por que reafirmar essa divisão, se o que desejamos é exatamente o contrário?
Na realidade, a educação infantil atende crianças de 0 a 5 anos, e é isso que interessa. Crianças de origens diferenciadas, mas que têm em comum o “ser
criança”, que se assemelham em algumas características e que brincam, inventam e sonham.
Felizmente, os avanços nos estudos referentes à aprendizagem e ao desenvolvimento infantil comprovam ser a criança uma curiosa exploradora
do mundo físico e social. Desde bebês, as crianças são capazes de estabelecer relações significativas com os adultos e os companheiros numa variedade e complexidade bem maiores do que o constatado no passado. Igualmente percebemos a criança como um ser global, sejam quais forem às circunstâncias e situações, independentemente de classe social, raça ou quaisquer outras diferenças. A relevante integração entre educar e cuidar lembra-nos que as atividades rotineiras também auxiliam na construção da identidade de uma criança. O que essa integração – educar e cuidar – na realidade quer enfatizar é a relevância e o direito da criança de ser educada e cuidada. Não existe uma forma de atendimento que dicotomize o cuidar do educador na Educação Infantil. Deve haver uma perfeita sintonia entre o adulto – educador e cuidador – e a criança a ser educada e cuidada. Assim, em estado de harmonia, os momentos vividos serão prazerosos e promoverão múltiplas aprendizagens, motivo pelo qual se faz necessário proporcionar envolvimento e atividades compartilhadas, em que ora a iniciativa é do adulto, ora é da criança. A maneira de pensar e agir que associa cuidado e educação precisa permear todo o projeto pedagógico dos centros infantis. Isso significa, em outras palavras, que cuidar inclui também preocupar-se com a organização do Centro Infantil, de seus horários, de seus espaços e dos materiais.
Isto é, que seja um ambiente acolhedor e agradável, seguro e alegre, que possa
oferecer experiências ricas e adequadas para as crianças que ali convivem diariamente. O ambiente e os momentos podem ser planejados de modo que
oportunizem autonomia nas rotinas, como vestir-se e despir-se, proceder à
higiene das mãos e da boca, alimentar-se, etc. Cabe ao educador identificar em
cada uma dessas ações de cuidados as inúmeras possibilidades educativas. Por
exemplo, nessas ações que citamos, as crianças estarão experimentando a consistência dos materiais de higiene, a leveza das roupas e a espessura dos panos, as cores e os sabores dos alimentos.
Os cuidados com a saúde (higiene, alimentação, crescimento e desenvolvimento) são também educativos, constituindo-se em funções a serem
vivenciadas e executadas por crianças e educadores.
Todos os momentos vividos pela criança são educativos, na medida em
que ela está constantemente aprendendo, através da sua interação com o meio
que a rodeia. Dessa forma, as dimensões do cuidado relativo à alimentação, ao
sono, à higiene, à saúde, etc., são educativas sim! Quando trocar a fralda de um bebê, por exemplo, é importante conversar com ele, pois os olhos se encontram, há toque, sensação tátil e movimento; este é um momento de interação, momento de vínculo e aprendizagem. Por outro lado, quando você está com um grupo na faixa etária de 4 a 5 anos realizando a higiene que antecede o lanche, há diálogos sobre esse momento e sua necessidade, igualmente o contato com a água, quente ou fria, a fricção com a toalha. Novamente este é um momento educativo!
E o lanche então! Rico encontro social e de aprendizado em que partilhamos, vemos se há comida para todo mundo, diferenciamos alimentos, comparamos,
classificamos e assim por diante.
Outro aspecto importante a destacar é a expectativa que as famílias têm ao deixarem seus filhos nos Centros Infantis.
Almejam uma educação de qualidade, que promova o desenvolvimento
cognitivo e social, mas também esperam que seus filhos sejam bem cuidados e atendidos em suas necessidades básicas e de afeto. A educação e o cuidado são
uma necessidade e um direito da criança primeiramente, mas também das famílias que depositam confiança no trabalho que os centros realizam.
A maneira como você recebe, todos os dias, cada criança e tudo o que acontece
com vocês até a hora da saída são vivências que contribuem para o desenvolvimento infantil, são geradoras de conhecimento e, portanto, educativas.
Então, o conjunto de todas essas experiências que se interpenetram são,
intrinsecamente, educação e cuidado.
Nesse contexto, podemos hoje superar a cisão maléfica na atuação com a
criança; na realidade, jamais deveríamos utilizar separadamente esses dois termos e, por conseqüência, o sentido deles.
No educar, está “embutido” o cuidar, pois a instituição infantil possui um inequívoco caráter educacional, mesmo porque a criança tem não somente necessidade, mas também direito de ser cuidada e educada.
Definitivamente, devemos tirar de nossas mentes a dicotomia educar/cuidar;
somente assim não mais a verbalizaremos e, o que é mais importante,
estaremos integrando cuidado e educação em nossos fazeres cotidianos.
Sedimentando o que até agora discutimos, não podemos deixar de conceituar o
cuidado na sua dimensão maior, que o designa não como um ato isolado, mas,
antes, como uma atitude de zelo, preocupação, responsabilidade e envolvimento afetivo.
Ou seja, o cuidado envolve atenção e afeto, pois somente cuidamos daquilo que
gostamos e desejamos preservar.
O cuidado encontra-se na base da constituição do homem, já que sem ele
não seríamos humanos. Implica aconchego, afeto, ternura, sintonia e, sobretudo,
implica valorizar e importar-se, com o outro e com o mundo, não focando somente o valor utilitário, mas primordialmente a dimensão do respeito, da reciprocidade e da complementaridade existente entre tudo e todos.
Concluindo – ou resumindo – as idéias aqui expostas, reiteramos enfaticamente
a necessidade de se ter claro que, na instituição infantil, todas as tarefas, brincadeiras e atividades realizadas têm valor educativo e envolvem cuidado.

Referências Bibliográficas
AMORIM, Elizabeth. A dimensão do cuidado essencial no fazer
pedagógico infantil como exigência primeira na construção da
cidadania planetária. Dissertação de Mestrado. São Leopoldo,
Faculdade de Educação da UNISINOS, 2002.
BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão
pela terra. 6.ed. Petrópolis Vozes, 2000.
CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo:
Gente, 2001.
DIDONET, Vital. Não há educação sem cuidado. Porto Alegre,
Pátio Educação Infantil, n.1, . p. 6-9 abr/jul. 2003.
HADDAD, Lenira. A ecologia do atendimento infantil:
construindo um modelo e sistema unificado de cuidado e
educação. Tese de Doutorado. São Paulo, Faculdade de Educação
da USP, 1997.
KULISZ, Beatriz. Prática pedagógica na educação infantil:
indicações para a construção de um referencial pedagógico.
Dissertação de Mestrado. Porto Alegre, Faculdade de Educação da
PUCRS, 2001.
ROSSETTI-FERREIRA, Maria Clotilde. A necessária associação
entre educar e cuidar. Porto Alegre, Pátio Educação Infantil, n.1,
p.10-12, abr./jul. 2003.
Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância
Cadernos Pedagógicos – volume 4

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

PEDAGOGIA DE PROJETOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Pedagogia de Projetos na Educação Infantil

Modernamente, a escola objetiva formar cidadãos autônomos e participativos na sociedade. Para conseguir formar este cidadão, é preciso desenvolver nos alunos a autonomia, a qual deve ser despertada desde a Educação Infantil. A Pedagogia de Projetos encontra-se como um instrumento de fácil operacionalização dentre a gama de possibilidades para atingir tal intento.

A Pedagogia de Projetos é uma metodologia de trabalho educacional que tem por objetivo organizar a construção dos conhecimentos em torno de metas previamente definidas, de forma coletiva, entre alunos e professores.
O projeto deve ser considerado como um recurso, uma ajuda, uma metodologia de trabalho destinada a dar vida ao conteúdo tornando a escola mais atraente. Significa acabar com o monopólio do professor tradicional que decide e define ele mesmo o conteúdo e as tarefas a serem desenvolvidas, valorizando o que os alunos já sabem ou respeitando o que desejam aprender naquele momento.
Na Pedagogia de Projetos, a atividade do sujeito aprendiz é determinante na construção de seu saber operatório e esse sujeito, que nunca está sozinho ou isolado, age em constante interação com os meios ao seu redor. Segundo Paulo Freire “o trabalho do professor é o trabalho do professor com os alunos e não do professor consigo mesmo”. O papel do educador, em suas intervenções, é o de estimular, observar e mediar, criando situações de aprendizagem significativa. É fundamental que este saiba produzir perguntas pertinentes que façam os alunos pensarem a respeito do conhecimento que se espera construir, pois uma das tarefas do educador é, não só fazer o aluno pensar, mas acima de tudo, ensiná-lo a pensar certo.
O mais importante no trabalho com projetos não é a origem do tema, mas o tratamento dispensado a ele, pois é preciso saber estimular o trabalho a fim de que se torne interesse do grupo e não de alguns alunos ou do professor, só assim o estudo envolverá a todos de maneira ativa e participativa nas diferentes etapas.
É importante perceber a criança como um ser em desenvolvimento, com vontade e decisões próprias, cujos conhecimentos, habilidades e atitudes são adquiridos em função de suas experiências, em contato com o meio, e através de uma participação ativa na resolução de problemas e dificuldades. Por isso, ao desenvolver um projeto de trabalho, os educadores devem estar cientes que algumas etapas devem seguidas:
A primeira delas é a intenção, na qual o professor deve organizar e estabelecer seus objetivos pensando nas necessidades de seus alunos, para posteriormente se instrumentalizar e problematizar o assunto, direcionando a curiosidade dos alunos para a montagem do projeto.
Em seguida, a preparação e o planejamento; nesta segunda etapa, planeja-se o desenvolvimento com as atividades principais, as estratégias, a coleta do material de pesquisa, a definição do tempo de duração do projeto, e como será o fechamento do estudo do mesmo. Ainda nesta fase, o professor deve, elaborar com os alunos a diagnose do projeto que consiste em registrar os conhecimentos prévios sobre o tema (o que já sabemos), as dúvidas, questionamentos e curiosidades a respeito do tema (o que queremos saber) e onde pesquisar sobre o tema, objetivando encontrar respostas aos questionamentos anteriores (como descobrir). Essas atividades prestam-se a valorizar o esforço infantil, contribuindo para a formação do autoconceito positivo.
Execução ou desenvolvimento; é nesta etapa que ocorre a realização das atividades planejadas, sempre com a participação ativa dos alunos, pois eles são sujeitos da produção do saber e, afinal, ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para sua construção. É interessante realizar, periodicamente, relatórios parciais orais ou escritos a fim de acompanhar o desenvolvimento do tema.
E enfim, a apreciação final, na qual é necessário avaliar os trabalhos que foram programados e desenvolvidos, dando sempre oportunidade ao aluno de verbalizar seus sentimentos sobre o desenrolar do projeto, desse modo ao retomar o processo, a turma organiza, constrói saberes e competências, opina, avalia e tira conclusões coletivamente; o que promove crescimento tanto no âmbito cognitivo, quanto no social, afetivo e emocional.
É possível a realização de dois ou três projetos concomitantes com bastante proveito, uma vez que podem abranger diversas áreas de conhecimento, o que oportuniza o desenvolvimento da autonomia para solucionar problemas com o espírito de iniciativa e de solidariedade.

Fernanda de Souza Reis Deprá
Professora de Educação Infantil do Município de Vargem Alta- ES
Graduada em Letras e Pós-Graduada em Educação Infantil.

Pedagogia de Projetos

Pedagogia de Projetos

1 - Em que consiste o Projeto?

Metodologia que visa organizar os alunos em torno dos objetivos.

2 - Função do Projeto

Tornar a aprendizagem mais ativa, mais significativa e mais real.

3 - Fases do Projeto
3.1 - Intenção


  • Escolher o tema

  • Identificar o nível de conhecimento dos alunos (o que já sabemos), (o que quremos saber).

3.2 - Preparação e Planejamento



  • Relação de idéias

  • Coleta de materiais

  • Organização de grupos

3.3 - Execução ou desenvolvimento



  • Cada um faz suas tarefas e socializa com o grupo.

3.4 - Apreciação final



  • O professor avalia os conteúdos;

  • Feedback;

  • O que foi importante;

  • O que conseguimos aprender;

  • Como foi a participação;

  • Houve comprometimento?

  • O que pode ser melhorado.

4 - Organização do Projeto


4.1 - Ter meta definida


4.2 - Visar a solução de algum problema


4.3 - Deve ser escolhido, discutido e planejado pela classe toda


4.4 - Somente metas e objetivos são fixos. O resto pode ser reestruturado


4.5 - A característica do projeto não é o tema e sim o tratamento dado a ele


4.6 - O trabalho, durante o desenvolvimento do projeto deve ser variado e multidisciplinar;



  • Laboratórios

  • Relatórios e registros

  • Entrevistas

  • Pesquisa bibliográfica

  • Pesquisa de campo

  • Montagem de maquetes

  • Montagem de boletim informativo

  • Produções escritas

  • Excursões, peças de teatros, e etc.

5 - Vantagens da Pedagogia de Projetos



  • Pode ser aplicada a todas as disciplinas

  • Proporciona conteúdo vivo a instrução

  • Segue o princípio da ação organizada em torno de um fim

  • Possibilita melhorar a compreensão do aluno sobre:

* As necessidades do contexto social


* O valor do planejamento cooperativo


* Os processos de grupo


* A importância da participação de cada um


* A relevância dos serviços prestados ao outro.



  • Favorece a construção de aprendizagem significativa

  • Propõem ou encaminha soluções para probemas levantados pelos alunos

  • Oportuniza a integração

  • Concentra o trabalho do aluno

  • Posibilita um diálogo entre as ciências

  • Desenvolve o pensamento divergente

  • Desperta o desejo de aprender

  • Habitua o aluno ao esforço, a perseverança no trato e enfrentamento de problemas reais

Magnólia Moura


Professora Graduada em Pedagogia, Especialista em Educação Infantil, Gestão e Organização da Escola e Metodologia do Ensino Superior. Professora Formadora da Secretaria Municipal de Educação de Maceió (SEMED).

domingo, 10 de janeiro de 2010

Howard Gardner


Howard Gardner - O cientista das inteligências múltiplas

A idéia de que existem várias aptidões além do raciocínio lógico-matemático, apresentada pelo psicólogo, causou grande impacto nos meios pedagógicos.
Formado no campo da psicologia e da neurologia, o cientista norteamericano Howard Gardner causou forte impacto na área educacional com sua teoria das inteligências múltiplas, divulgada no início da década de 1980. Seu interesse pelos processos de aprendizado já estava presente nos primeiros estudos de pós-graduação, quando pesquisou as descobertas do suíço Jean Piaget (1896-1980). Por outro lado, a dedicação à música e às artes, que começou na infância, o levou a supor que as noções consagradas a respeito das aptidões intelectuais humanas eram parciais e insuficientes.

Até ali, o padrão mais aceito para a avaliação de inteligência eram os testes de QI, criados nos primeiros anos do século 20 pelo psicólogo francês Alfred Binet (1857-1911) a pedido do ministro da Educação de seu país. O QI (quociente de inteligência) media, basicamente, a capacidade de dominar o raciocínio que hoje se conhece como lógico-matemático, mas durante muito tempo foi tomado como padrão para aferir se as crianças correspondiam ao desempenho escolar esperado para a idade delas. "Como o aprendizado dos símbolos e raciocínios matemáticos envolve maior dificuldade do que o de palavras, Binet acreditou que seria um bom parâmetro para destacar alunos mais e menos inteligentes", diz Celso Antunes, coordenador-geral de ensino do Centro Universitário Sant’ Anna, em São Paulo. "Mais tarde, Piaget também destacou essa dificuldade e, dessa forma, cresceu exponencialmente a valorização da inteligência lógico-matemática."

Trabalho dos gênios

Sob a influência do norte-americano Robert Sternberg, que estudou as variações dos conceitos de inteligência em diferentes culturas, Gardner foi levado a conceituá-la como o potencial para resolver problemas e para criar aquilo que é valorizado em determinado contexto social e histórico. Na elaboração de sua teoria, ele partiu da observação do trabalho dos gênios. "Ficou claro que a manifestação da genialidade humana é bem mais específica que generalista, uma vez que bem poucos gênios o são em todas as áreas", afirma Antunes. Gardner foi buscar evidências também no estudo de pessoas com lesões e disfunções cerebrais, que o ajudou a formular hipóteses sobre a relação entre as habilidades individuais e determinadas regiões do órgão. Finalmente, o psicólogo se valeu do mapeamento encefálico mediante técnicas surgidas nas décadas recentes. Suas conclusões, como a maioria das que se referem ao funcionamento do cérebro, são eminentemente empíricas. Ele concluiu, a princípio, que há sete tipos de inteligência:
1. Lógico-matemática é a capacidade de realizar operações numéricas e de fazer deduções.
2. Lingüística é a habilidade de aprender idiomas e de usar a fala e a escrita para atingir objetivos.
3. Espacial é a disposição para reconhecer e manipular situações que envolvam apreensões visuais.
4. Físico-cinestésica é o potencial para usar o corpo com o fim de resolver problemas ou fabricar produtos.
5. Interpessoal é a capacidade de entender as intenções e os desejos dos outros e conseqüentemente de se relacionar bem em sociedade.
6. Intrapessoal é a inclinação para se conhecer e usar o entendimento de si mesmo para alcançar certos fins.
7. Musical é a aptidão para tocar, apreciar e compor padrões musicais.

Enfoques variados para habilidades diversas

Muitas escolas, inclusive no Brasil, se esforçaram para mudar seus procedimentos em função das descobertas de Howard Gardner. A maneira mais difundida de aplicar a teoria das inteligências múltiplas é tentar estimular todas as habilidades potenciais dos alunos quando se está ensinando um mesmo conteúdo. As melhores estratégias partem da resolução de problemas. Segundo Gardner, não é possível compensar totalmente a desvantagem genética com um ambiente estimulador da habilidade correspondente, mas condições adequadas de aprendizado sempre suscitam alguma resposta positiva do aluno – desde que elas despertem o prazer do aprendizado. O psicólogo norteamericano atribui à escola duas funções essenciais: modelar papéis sociais e transmitir valores. "A missão da educação deve continuar a ser uma confrontação com a verdade, a beleza e a bondade, sem negar as facetas problemáticas dessas categorias ou as discordâncias entre diferentes culturas", escreveu. Pela própria natureza de suas descobertas, o trabalho de Gardner favorece uma visão integral de cada indivíduo e a valorização da multiplicidade e da diversidade na sala de aula.
Mais tarde, Gardner acrescentou à lista as inteligências natural (reconhecer e classificar espécies da natureza) e existencial (refletir sobre questões fundamentais da vida humana) e sugeriu o agrupamento da interpessoal e da intrapessoal numa só.

A primeira implicação da teoria das múltiplas inteligências é que existem talentos diferenciados para atividades específicas. O físico Albert Einstein tinha excepcional aptidão lógico-matemática, mas provavelmente não dispunha do mesmo pendor para outros tipos de habilidade. O mesmo pode ser dito da veia musical de Wolfgang Amadeus Mozart ou da inteligência físico-cinestésica de Pelé. Por outro lado, embora essas capacidades sejam independentes, raramente funcionam de forma isolada.

Desvendando a mente humana

Os anos 1990 ficaram conhecidos como a década do cérebro graças aos novos procedimentos de visualização do interior do corpo humano e, principalmente, ao grande número de estudos desafiadores sobre o assunto. "A teoria das inteligências múltiplas não poderia ter ganho as mesmas diversidade e dimensão sem as admiráveis conquistas das ciências da cognição nesse período", diz Celso Antunes. Alguns dos cientistas que mais contribuições trouxeram à área foram António Damasio, Oliver Sacks, Joseph LeDoux e Steven Pinker. Entre as descobertas recentes que contrariam crenças antigas estão a de que o cérebro mantém o potencial de evolução durante toda a vida e que funções de regiões lesionadas podem ser assumidas por outras, se estimuladas. Apesar dos avanços, a mente humana continua a ser um vasto território a explorar. A intensificação das pesquisas faz prever muitas novidades para os próximos anos.
O que leva as pessoas a desenvolver capacidades inatas são a educação que recebem e as oportunidades que encontram. Para Gardner, cada indivíduo nasce com um vasto potencial de talentos ainda não moldado pela cultura, o que só começa a ocorrer por volta dos 5 anos. Segundo ele, a educação costuma errar ao não levar em conta os vários potenciais de cada um. Além disso, é comum que essas aptidões sejam sufocadas pelo hábito nivelador de grande parte das escolas. Preservá-las já seria um grande serviço ao aluno. "O escritor imita a criança que brinca: cria um mundo de fantasia que leva a sério, embora o separe da realidade", diz Gardner.

Para pensar

Uma das conseqüências nefastas da valorização exclusiva da inteligência lógico-matemática é a tendência de definir o desempenho dos alunos mais pelo que eles não são (dada a impossibilidade de que todos se destaquem numa única área de conhecimento) do que pelo que são. Ainda prevalece o hábito de valorizar as habilidades relacionadas às artes e aos esportes apenas nas chamadas atividades extracurriculares. Você acha que, em sua prática diária, isso pode começar a ser mudado? De que forma?


Biografia

Howard Gardner nasceu em Scranton, no estado norteamericano da Pensilvânia, em 1943, numa família de judeus alemães refugiados do nazismo. Ingressou na Universidade Harvard em 1961 para estudar história e direito, mas acabou se aproximando do psicanalista Erik Erikson (1902-1994) e redirecionou a carreira acadêmica para os campos combinados de psicologia e educação. Na pós-graduação, pesquisou o desenvolvimento dos sistemas simbólicos pela inteligência humana sob orientação do célebre educador Jerome Bruner. Nessa época, Gardner integrou-se ao Harvard Project Zero, destinado inicialmente às pesquisas sobre educação artística. Em 1971, tornou-se co-diretor do projeto, cargo que mantém até hoje. Foi lá que desenvolveu as pesquisas sobre as inteligências múltiplas. Elas vieram a público em seu sétimo livro, Frames of Mind, de 1983, que o projetou da noite para o dia nos Estados Unidos. O assunto foi aprofundado em outro campeão de vendas, Inteligências Múltiplas: Teoria na Prática, publicado em 1993. Nos escritos sobre educação que se seguiram, enfatizou a importância de trabalhar a formação ética simultaneamente ao desenvolvimento das inteligências. Hoje leciona neurologia na escola de medicina da Universidade de Boston e é professor de cognição e pedagogia e de psicologia em Harvard. Nos últimos anos, vem pesquisando e escrevendo sobre criadores e líderes exemplares, tema de livros como Mentes Extraordinárias. Em 2005, foi eleito um dos 100 intelectuais mais influentes do mundo pelas revistas Foreign Policy e Prospect.
Fonte: www.novaescola.com.br

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

PORTFÓLIO


CENTRAL DE ENSINO E APRENDIZADO DE ALAGOAS
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR
DISCIPLINA: METODOLOGIA DO ENSINO SUPERIOR
PROFESSORA: MAGNÓLIA MOURA

PORTFÓLIO- RESUMO

CONCEITO

• É um instrumento que compreende a compilação de todos os trabalhos realizados pelos alunos, durante um curso ou disciplina.
• Inclui entre outros elementos: registros de visitas, resumos de textos, projetos e relatórios de pesquisa, anotações de experiências, etc.
• Inclui também ensaios auto-reflexivos, que permitem nos alunos a discussão de como a experiência no curso ou disciplina mudou sua vida.

OBJETIVOS DO PORTFÓLIO:
• Ajudar os estudantes a desenvolver a habilidade de avaliar seu próprio trabalho.
• Auxiliar a avaliação do impacto de programas educacionais.

USOS
• Demonstração, pelo estudante, de habilidades específicas, competências e valores/
• Possibilidade do aluno refletir sobre seu próprio aprendizado e avaliá-lo;
• Explicação, pelo estudante, da natureza do trabalho e que tipo de desenvolvimento esta tarefa possibilitou/
• Fornecimento de retro-infomação (feedback) para os estudantes, pelo professor ou comitê que avaliou o portfólio.

VANTAGENS
• Obtenção de informações sobre qualidade acadêmica, construção e eficácia do material relacionado à carreira escolhida pelo estudante;
• Os professores melhoram sua própria habilidade de avaliar os alunos. Os alunos envolvem-se ativamente no desenvolvimento de seus portfólios pessoais;
• A avaliação é compartilhada com o estudante e com outros professores;
• O aluno aprende a revisar seus trabalhos de maneira organizada;
• Como é usada para relatar experiências e realizações, melhora e habilidade de comunicação;
• Os alunos aprendem a tomar posse do aprendizado, ao envolver-se ativamente na elaboração de seus portfólios;
• O professor tem a oportunidade de examinar a experiência curricular como um todo, identificando os pontos que precisam ser aperfeiçoados;
• O professor obtém uma apreciação da vivência universitária, a partir da perspectiva dos estudantes.

SUGESTÕES

É importante que o portfólio contenha um diário reflexivo para o aluno registrar os pensamentos, sentimentos e auto-avaliações de crescimento ao longo de as experiência de ensino.

EXEMPLOS

Estudante que apresente ao final de uma disciplina: resposta ao primeiro questionário no 1º dia de aula, fichas de leitura, relatório de visitas, ficha resumo, materiais produzidos, relato de experiências, parecer, artigos, etc.

domingo, 3 de janeiro de 2010

História Social da Criança e da Família




Quem trabalha com Educação Infantil não pode deixar de ler esse livro de Philippe Áries.

Resenha
Por Daniel Chiozzini

História Social Da Criança E Da Família
(Philippe Ariès)



A leitura da obra de Philippe Ariès nos permite ter contato com uma produção historiográfica notadamente datada. A primeira edição brasileira é a tradução de uma versão francesa de 1973, um resumo do estudo original publicado em 1960. Esta versão de 1973 ganhou também o acréscimo de um prefácio do autor, no qual ele traz um balanço das repercussões e críticas que seu trabalho despertou.
A década de 1960 foi um período de consolidação do chamado movimento da "História Nova", corrente que é apontada por alguns como responsável por uma "revolução francesa da historiografia", devido ao fato de propor novos objetos, novos métodos e novas linguagens na escrita da história.
Entre essas inovações, está a abertura para o estudo do cotidiano dos "homens comuns" e de temas até então reservados à antropologia, como a alimentação, corpo, o mito, a morte etc. A historiografia ganha obras que trabalham com uma multiplicidade de documentos (fotos, diários, músicas etc.) e usam a linguagem narrativa.
Composta essencialmente por historiadores franceses, seus princípios estão enraizados no trabalho de historiadores como Marc Bloch, Lucien Febvre e Fernand Braudel, responsáveis pela desconstrução da história positivista no século XIX. Trata-se de um percurso paralelo ao trilhado pelas inovações na tradição historiográfica marxista, cujo maior nome talvez seja o do historiador inglês Edward Thompson.
Aproximadamente no final da década de 60, a "história nova" ganha uma pluralidade de tendências, entre as quais está aquela que se denomina história das mentalidades, voltada para as sensibilidades e para elucidar diferentes visões de mundo e conceituações presentes em diferentes períodos históricos, na qual Philippe Ariès situa sua obra. No prefácio da edição de 1973, ele aponta alguns dos princípios que norteiam sua interpretação: "A história das mentalidades é sempre, quer o admita ou não, uma história comparativa e regressiva. Partimos necessariamente do que sabemos sobre o comportamento do homem de hoje, como de um modelo ao qual comparamos os dados do passado - com a condição de, a seguir, considerar o modelo novo, construído com o auxílio de dados do passado, como uma segunda origem, e descer novamente até o presente, modificando a imagem ingênua que tínhamos no início" (p.26)
A partir desses pressupostos, o estudo de Áries possui dois fios condutores: o primeiro é a constatação de que a ausência do sentido de? Infância? Tal como um estágio específico do desenvolvimento do ser humano, até o fim da Idade Média, abre as portas para uma interpretação das chamadas ? Sociedades tradicionais? Ocidentais. O segundo é que este mesmo processo de definição da infância como um período distinto da vida adulta também abre as portas para uma análise do novo lugar assumido pela criança e pela família nas sociedades modernas. Sua obra foi precursora, portanto, de um novo campo que ficou conhecido como? História da infância? E gerou diversos trabalhos subseqüentes. A constituição desse novo conceito de infância está na transição dos séculos XVII para o XVIII, quando ela passa ser definida como um período de ingenuidade e fragilidade do ser humano, que deve receber todos os incentivos possíveis para sua felicidade. O início do processo de mudança, por sua vez, nos fins da Idade Média, tem como marca o ato de mimar e paparicar as crianças, vistas como meio de entretenimento dos adultos (especialmente da elite), hábito criticado por Montaigne
(1533-1592) e outros escritores da época. A morte também passa a ser recebida com dor e abatimento. Já no século XVII, as perspectivas transitam para o campo da moral, sob forte influência de um movimento promovido por Igrejas, leis e pelo Estado, onde a educação ganha terreno: trata-se de uma instrumento que surge para colocar a criança "em seu devido lugar?, assim como se fez com os loucos, as prostitutas e os pobres. Embora com uma função disciplinadora, a escola não nasce com uma definição de idade específica para a criança ingressá-la. Isto porque os referenciais não eram o envelhecimento (ou amadurecimento) do corpo. A ciência moderna ainda não havia triunfado e educação nascia, portanto, com uma função prática, ora de disciplinar, ora de proporcionar conhecimentos técnicos, que posteriormente configuram uma escola para a elite e outra para o povo. A análise feita por Áries, portanto, destaca-se por fornecer elementos para problematizarmos a infância em uma sociedade que, desde a conclusão da obra, apresenta um individualismo acentuado. Muitas vezes nos deparamos com crianças (e, mais recentemente, adolescentes) que são vistos como projeções de expectativas dos pais ou que são protegidos ou mimados, reinventando o hábito de fins da Idade Média. Os perigos e conseqüências desta situação podem, sem dúvida, serem melhor compreendidos a partir das reflexões presentes em História Social da Criança e da Família.

Poema de Bárbara Lia Brasil


imagem: achei na net, quem souber o autor, por favor, ajude-me a dar os créditos
A NOITE PERFUMADA DA MAGNÓLIA

No silêncio da noite a tela do computador enegrecida. Estava saturada do virtual. Queria o mundo real e sua respiração primeva. Tinha anseios de pisar de novo o chão, andar descalça como menina, andar sem medo da sujeira, sem medo de ferir a sola, sem medo.
Medo era a palavra do milênio.
Viver mergulhada em um mundo medroso era a angústia suprema.
No entanto, não via poetas escrevendo odes ao medo.
Estavam escondidos os poetas.
Em suas catacumbas ou em suas torres de marfim?
Andava a procura de um poeta maldito que subisse em um monumento e vociferasse um canto que fizesse mais alarde que o balé das pombas na Praça Santos Andrade.
A poesia escassa, o ar escasso, o amor escasso...
Sonhou percepções, ansiou-as como um doente terminal ao soro salvador.
Retirar da cartola lentamente as percepções primeiras.
Bebeu uma jarra inteira de suco de maracujá lembrando a exótica flor do maracujá no quintal da infância.
Bebeu cada estriada luz lilás dos filamentos da flor.
Respirou uma sinfonia de Beethoven, acendeu o incenso de eucalipto e desejou que o mundo todo pintasse o amor verde-azul, as noites estreladas de Van Gogh, a poesia em um quadro que a fizesse crer que era bem mais a vida que a ausência de ar e de poetas. Escrevia suas poesias em um livro de capa grossa azul que não mostrava a ninguém. Passou dias e dias bebendo poesias lembrando o tempo das percepções.

Primeira percepção: A noite é perfumada.

A menina Magnólia vivia como se fosse alma.
Hoje a realidade a prega no chão bruto, piso marrom manchado de vinho, janela com cortina bege e vista para o bairro.
Vista para a cidade cinza.
Magnólia sempre foi alma.
Sempre usou o corpo como um títere.
Manejava acima o enredo seu: escolhia a música e a poesia.
O corpo era instrumento amorfo.
Vivia com a alma.

Percepções.

A primeira percepção da menina – A noite é perfumada.

Respirava a noite.
Calçada estreita de cimento cinza e lateral de tijolos díspares como dentes encavalados.
A fila de tijolos ocres cercando a calçada cinza quase branca e acima dela mais brancas ainda as pequeninas flores e mais acima e mais brancas quiçá, as estrelas.
O perfume era imã para a felicidade.
De dentro da casa a luz não era irritante como as deste século.
Ligeiramente avermelhada como o brilho das sementes de romãs.
No rádio uma música de seresta, ou uma viola sertaneja.
A noite é perfumada.
Nunca soube se de mínimas flores ou de estrelas aquele perfume.
Mas guardou a imagem intacta na tela:
A menina magrela com vestido de babados de tecido anarruga branco.
Cabelos curtos, franja bonita na testa.
Saltitando entre uma chuva de pequenas pétalas em uma estreita calçada...
(...)
Segunda percepção – A luz se move

Vagalumes são faróis terrestres.
Siameses de estrelinhas verdes.
Espiões de meninas travessas.
Detrás das árvores de flores brancas eles abduziam Magnólia.
Piscavam, enfeitiçavam.
O luscofusco magnético fazia com que ela girasse em ciranda acompanhando a impossível luz.
Ninguém ensinou à Magnólia como colher vagalumes e estrelas.
A primeira vez que Magnólia entrou solenemente na vida, era esta a percepção:
Uma calçada clareada de chuva de mínimas flores brancas, uma janela com luz estranha lembrando o miolo de romãs e vagalumes distantes de seus dedos frágeis.
Magnólia colecionava palavras e não sabia qual a sua primeira palavra.
A mãe jamais dissera.
Por isto imaginava que sua primeira palavra tinha a ver com flor e luz e inseto que incendeia em luscofusco.
Talvez tenha sido um suspiro sua primeira palavra.
Ou uma interjeição.
Ah!
O que mais pode expressar o sentimento de inserção...
Talvez tivesse repetido o som da flor que cai suave e branca na calçada.
E este som era o prenúncio de que o paraíso está ali na esquina.
Andava com prenúncios de paraíso ouvindo o som da flor que cai.

Bárbara Lia Brasil (blog chapar das borboletas)

Assim é a poesia de Bárbara Lia: aquele encantamento de se poder visualizar a alma feminina na maravilha da poesia mulher: seu olhar, sua vida, alvos e errâncias, coisas e seres, tudo no redemoinho lírico de sua língua fêmea. (Luíz Alberto Machado)

Flor da Magnólia





Natureza morta com Magnólia de MATISSE e Flor da Magnólia branca


Magnólia - Árvore de Beleza Ornamental
Magnólia (Magnolia grandiflora) é uma árvore de folhas perenes da família das magnoliáceas, que chega a alcançar trinta metros de altura e é originária do hemisfério norte. De copa frondosa, suas folhas, coriáceas e brilhantes, são verdes e lustrosas na parte superior e castanhas na parte inferior. As flores, brancas e perfumadas, também chamadas magnólias, chegam a vinte centímetros de diâmetro.
Ao gênero Magnólia pertencem cerca de oitenta outras espécies de árvores e arbustos, que se distribuem geograficamente por quase todo o mundo e também são conhecidas pelo nome comum de magnólia. No Brasil se cultivam várias dessas espécies, e também outras, do gênero Michelia, da mesma família, como a magnólia-amarela (Michelia champaca), ou magnólia-de-petrópolis. As magnólias preferem solos profundos e adubação regular, não requerem poda nem se dão bem em climas frios.

Uma das árvores mais cultivadas por sua beleza ornamental nos parques e jardins das zonas temperadas, a magnólia é assim chamada em homenagem a Pierre Magnol, botânico francês do século XVII.

Magnólia = Significa "Amor a Natureza" ou "Simpatia"

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Congresso em Educação



Congresso Brasileiro sobre Dificuldades de Aprendizagem e do Ensino


Philippe Perrenoud

Palestra

Avaliação e desenvolvimento profissional

Definição do desenvolvimento profissional

No sentido mais amplo de seu significado, o conceito de « desenvolvimento profissional » abrange « todas as transformações individuais e coletivas de competências e de componentes de identidade mobilizados ou suscetíveis de serem mobilizados em situações profissionais ».
Este conceito engloba, ao mesmo tempo, a construção das competências nas formações individuais ou coletivas, mas também a construção de competências novas, pela prática e pela reflexão sobre a prática, assim como as transformações de identidade dos indivíduos ou dos grupos.
O « desenvolvimento profissionnal » consiste, essencialmente, na construção de competências e nas transformações de identidade em situações de trabalho (ao longo da carreira), assim como nas situações de formações profissionalizantes e contínuadas.
Cada vez mais, práticas de avaliação múltiplas e plurais determinam os percursos de formação e os percursos profissionais, sendo, potencialmente, geradoras do desenvolvimento profissional.

Uma hipótese otimista ?

Esta é a definição dos organizadores de um colóquio organizado em janeiro de 2009, em Louvain-la-Neuve (Bélgica).
Apresento essa definição, pois ela me parece globalmente aceitável.
Para questionar a parte final da última afirmação: « práticas avaliativas múltiplas e plurais determinam os percursos de formação e os percursos profissionais e são potencialmente geradoras de desenvolvimento profissional ».

Uma prudência um pouco limitada

Dizer que as práticas avaliativas são, apenas, “potencialmente” geradoras de desenvolvimento profissional, é reconhecer que este potencial não é automaticamente atualizado e questionar a questão das condições favoráveis.
Porém, eu proponho um questionamento mais amplo: certas práticas avaliativas podem paralisar, inibir o desenvolvimento profissional ?
Saliento também a hipótese que a avaliação institucional, tal como a vemos ser aplicada no mundo, poderia muito bem impedir o desenvolvimento profissional.

Pontos de partida

Toda expansão da avaliação não é, ipso facto, um progresso. Como para os outros fenômenos, a situação ótima se encontra entre estes dois patamares: abaixo do patamar inferior, não há regulação ; acima do patamar superior, a avaliação se torna uma finalidade em si mesma, uma conduta obsessiva.
Toda prática de avaliação, exceto se for livremente solicitada pelo indivíduo ou pelo sistema a serem avaliados, se insere numa relação assimétrica: o avaliador tem o poder de avaliar um indivíduo ou um sistema, se necessário, contra a vontade dos mesmos.
A questão metodológica (como avaliar de maneira confiável e com equidade) não deixa nunca de lado a questão sociológica: quem avalia quem, com que direito, para que fins ?

A avaliação institucional

A avaliação institucional pode ser definida como uma prática inserida nas regras de funcionamento de uma organização e, por sua vez, impõe-se a seus membros, tanto avaliadores como avaliados.
A avaliação formal dos aprendizados e da conduta formal dos alunos é uma avaliação institucional, assim como a avaliação dos professores e dos outros funcionários, feita pelo governo ou pelo ambiente.
A noção se estende à avaliação de todo o sistema educacional e, também, aos programas e às políticas públicas.
A avaliação institucional assumiu uma dimensão crescente com o surgimento do New Public Management, sendo salientada uma preocupação em termos de eficiência e de regulação.

Num mundo ideal

Cada um tem objetivos claros e se esforça para atingí-los com eficácia e ética.
Assim, a ação é permanentemente avaliada, para que possam ser feitas as correções necessárias.
Quando os resultados não correspodem ao que se almeja, são colocadas em questão as próprias competências e maneira de executar a ação.
Se forem constatadas insuficiências, a curto prazo, o indivíduo que executa a ação solicita ajuda e, a médio prazo, se insere num processo de desenvolvimento profissional.
Como, num mundo ideal, a avaliação institucional não é necessária, a organização pode limitar-se a apoiar o desenvolvimento de cada um.

No mundo real do trabalho

Os diretores da organização acreditam, com ou sem razão, que nem todos os colaboradores têm a força ou a lucidez necessárias para reconhecer os limites de suas competências e aceitar fazer parte do problema.
Isto porque eles executam uma avaliação externa, com a intenção de garantir o funcionamento e os resultados.
Os profissionais e os subsistemas sabem, então, que são ou serão avaliados, às vezes com base em procedimentos e critérios anunciados, às vezes sem saber exatamente quando, como, por quem.

Ser ardiloso para ter um bom resultado

A partir do momento em que têm ciência de que são ou serão avaliados, os atores e os subsistemas elaboram estratégias para se protegerem de uma avaliação negativa.
A estratégia mais eficaz consiste, obviamente, em realizar perfeitamente o seu trabalho, mas essa estratégia é árdua.
E, sobretudo, ela só é praticável se as expectativas da organização levam em conta as condições do trabalho real.
Raramente, numa avaliação, é considerado o trabalho real, principalmente quando a direção da organização deve prestar contas a seus acionistas ou a seus eleitores, não podendo apresentar objetivos razoáveis sem decepcioná-los.

Atores condenados a ser ardilosos

Os atores individuais ou coletivos são levados a dar a impressão que trabalham melhor do que podem.
Para isso, eles devem conhecer os« indicadores de desempenho» que os avaliadores utilizam.
Os avaliados podem tentar enfraquecer a legitimidade desses indicadores, afirmando, por exemplo, que os resultados dos alunos não são índices confiáves da eficácia dos professores e das instituições.
Como é difícil desqualificar os indicadores, resta, por exemplo, a ilusão de preparar específicamente os alunos para provas padronizadas.
E depois, no final das contas, busca-se desculpas para explicar as defazagens.

Como a avaliação institucional pode impedir o desenvolvimento

Os esforços exigidos pela avaliação institucional demandam uma energia e um tempo que são subtraídos de outra coisa.
A organização é o ponto cego da avaliação.
A avaliação institucional desestimula qualquer transparência. Todo reconhecimento de dificuldade ou de fracasso pode se voltar contra aqueles que se arriscam ingenuamente.
A avaliação institucional se apodera da auto-avaliação tornando-a, ao mesmo tempo, obrigatória e perigosa.
A avaliação institucional coloca os atores e os sub-sistemas numa situação concorrência. Cada um protege os seus saberes.
A avaliação institucional se fundamenta no próprio desenvolvimento profissional e o normatiza!

1. Trabalhar para provar que se trabalha

Christophe Dejours mostra que nas instituições uma parte crescente do trabalho serve para provar que se trabalha e/ou para alimentar uma avaliação do desempenho.
Esta pressão, exercida principalmente sobre os diretores de estabelecimento, acarreta a coleta de uma ‘montanha’ de dados cujo destino final e razão de ser não são muito claros.
Cada vez mais, os atores têm a impressão que a informação principal não é aquela que lhes permite decidir com discernimento, mas a que deve ser transmitida aos superiores hierárquicos.
Vemos instaurar-se em certas burocracias uma dissociação mortífera entre o tratamento da informação e seu sentido: preenche-se formulários e relatórios para que não se tenha aborrecimentos.
Em paralelo, isso alimenta a impressão de que outros se encarregarão do comando, que basta “transmitir para instâncias superiores”.


2. A organização, ponto cego da avaliação institucional

A avaliação institucional se fundamenta, muitas vezes, no postulado que as tarefas são bem definidas, que o prescrito é racional, que a organização e a divisão do trabalho são devidamente pensadas, ou seja, aquilo que vem dos superiores hierárquicos não faz parte do problema.
Desta maneira, a regulação deve estar relacionada ao empenho dos trabalhadores, à sua compreensão das tarefas e dos procedimentos e às suas competências.
Evidenciar outros obstáculos, próprios do sistema, questionar os superiores hierárquicos e/ou a noosfera acaba sendo interpretrado como uma busca de desculpas.
Então, a prática reflexiva e a avaliação institucional podem entrar em conflito (rotinas defensivas).

3. Nunca admitam

Todo mundo « sabe » que o trabalho real nunca é a realização pura e simples do prescrito.
Todo mundo « sabe » que poucos operadores têm todas as competências necessárias e tem, permanentemente, condições de utilizá-las da melhor forma possível.
Todo mundo « sabe » que uma organização humana tem muitas de falhas que não a impedem de funcionar.
Mas a avaliação institucional « não quer saber» de nada disso, ela navega na ilusão da racionalidade ilimitada.
Tanto é que a constatação da mínima imperfeição pode colocar em perigo os trabalhadores.

4. A auto-avaliação confiscada

A avaliação institucional exige, muitas vezes, que os avaliados comecem se auto-avaliando, para conscientizar-se do que não funciona.
Consequentemente, o que deveria ser um procedimento autônomo se torna um pensum, um gênero literário em si que consiste em reconhecer algumas imperfeições, mas nada grave, numa lógica de confissão.
Nada impede, teoricamente, que os atores e os subsistemas façam uma auto-avaliação de uso externo e uma outra para uso próprio.
Mas o acúmulo de trabalho e o sentimento que essa auto-avaliação não tem sentido podem desestimular a participação nesse duplo processo.

5. Cada um por si

Apesar de não reconhecerem isso, os responsáveis pela avaliação institucional sabem que não há comprometimento com o impossível.
Então, inevitavelmente, eles comparam instituições e profissionais, para ter pontos de referência: uma instituição ou um profissional somente apresentarão uma « subperformance » em comparação com os outros.
O jogo vai, portanto, consistir em obter um melhor melhor resultado que os outros.
Vai consistir também em esconder a própria reflexão, em conduzí-la num circuito fechado, deixando os outros « se virarem » sozinhos.
Só se fala de organização aprendente, mas impede-se a circulação de constatações, de hipóteses, de soluções.

6. Desenvolvimento profissional avaliado

Os dirigentes das organizações têm plena consciência do papel essencial do desenvolvimento profissional.
Então, se eles não fizerem desta forma de investimento subjetivo uma norma, farão, no mínimo, com que seja uma postura valorizada na cultura interna.
A partir daí, o próximo passo será basear a avaliação institucional no próprio desenvolvimento profissional.
Tanto assim que, o que deve partir dos trabalhadores, da sua consciência profissional, da sua vontade de progredir, é definido como uma expectativa e mesmo um objeto de contrôle.
Desmunido da iniciativa de seu próprio desenvolvimento, o trabalhador pode ter um sentimento de indiferença.

Caricatura ?

Naturalmente, esses efeitos perversos não ocorrem em todas as partes com a sua amplitude máxima e não se conjugam sistematicamente para fazer da avaliação instutucional o maior obstáculo para o desenvolvimento profissional.
Saliento que descrevi a pior configuração, esperando que isso não caracterize todas as organizações.
Antes de tranquilizarmo-nos e propormos ferramentas de avaliação do desenvolvimento pessoal, compartilhemos por um instante as preocupações de Christophe Dejours, um especialista em sofrimento no trabalho.

Segundo Christophe Dejours

De acordo com a mentalidade vigente, tudo neste mundo poderia ser objeto de avaliação. Assim, o que se furta à avaliação seria suspeito de coluio com a mediocridade ou com o obscurantismo. O trabalho não escapa a esta lógica e sua avaliação objetiva está na base dos novos métodos de gestão, de administração e de organização do trabalho.
Porém, a investigação clínica do trabalho sugere que uma parte essencial da atividade humana provém de processos que não são observáveis e resistem, portanto, a toda avaliação objetiva. Fonte de dificuldades que aumentam a carga de trabalho, a avaliação dos desempenhos tem também efeitos perversos (sentimentos de injustiça ou condutas desleais entre colegas). Talvez uma boa parte do sofrimento e da patologia mental no mundo do trabalho esteja ligada às novas formas de avaliação.
Christophe Dejours (2003). L’évaluation du travail à l’épreuve du réel. Critique des fondements de l’évaluation. Dijon : INRA Éditions.

A análise sim, a avaliação não !

Dejours não se opõe à obsevação e à análise do trabalho, muito pelo contrário.
Como outros especialistas do trabalho, ele coloca essa observação e essa análise no cerne do processo de desenvolvimento profissional (concientização, prática reflexiva).
Mas não lhe parece urgente conceber essa observação e essa análise como processos de avaliação.
Principalmente porque são propostas permanentemente comparações com base numa norma de desempenho ou no desempenho dos outros trabalhadores ou das outras instituições.

Dilema

Somos capazes de dizer que, às vezes, o progresso é termos menos avaliação?
Isto não quer dizer termos menos lucidez, menos observação, menos análise, menos reflexão, menos julgamento.
Mas menos normas, comparações, classificações.
Aqui reside a questão das relações que os especialistas em avaliação estabelecem com a “cultura da avaliação”, que se impõe atualmente nos sistemas educacionais .
Não há desenvolvimento profissional sem lucidez, sem auto-avaliação, “entre intuição e instrumentação”.
Mas ajudar a organização a normatizar a avaliação com o pretexto de garantí-la, isso é um procedimento inteligente? E é esse o nosso papel ?

http://www.unige.ch/fapse/SSE/teachers/perrenoud/

Laboratoire Innovation-Formation-Education

LIFE

http://www.unige.ch/fapse/life